sábado, 29 de setembro de 2007

El Pasado

Assisti hoje de manhã a uma sessão de El Pasado, novo filme de Hector Babenco, com estréia prevista para início de novembro. Confesso que estava bastante curioso, pois havia lido o roteiro e falado sobre o filme com o Hector pouco antes de ele começar a filmar. O filme é muito forte e fica (está) comigo, suas imagens me vêm a mente, seus temas me induzem à reflexão constante. Além disso o filme é lindo de se ver, Ricardo Della Rosa (e Babenco, claro)fotografa Buenos Aires com uma autenticidade profunda. O filme exala argentinidade, mas sem tratar especificamente de nada argentino. Ainda assim me vi transportado àquela cidade que amo, onde vivi e onde pretendo ainda viver. A cena do parto é emocionante e certamente o parto mais bem filmado que vi no cinema. Enfim, estou divagando aqui, não é um filme que se digira rapidamente. Um filme para ser revisto e pensado.

quinta-feira, 27 de setembro de 2007

Mais "Tropa"

Para usar um termo bem americano, "Tropa" virou um event movie. Sem querer me dar mais mérito do que mereço, mas estes dias vi que muito do que escrevo aqui tem ecoado na imprensa... Sinal de que estamos pensando no filme, e, como eu disse, que ele realmente provoca uma discussão. Eu bato o pé: "Tropa" não é um filme fascista, mas ele esfrega em nossa cara o lado mais podre da nossa sociedade (ops, esqueci Brasília!).
Quanto à pirataria, algumas observações:
* Acho que o filme tinha potencial para algo entre 3 e 4 milhões de espectadores nas salas de cinema.
* Posso estar errado (é bem possível, e saberemos em dois meses!) mas acho que dificilmente passará dos 2 milhões de espectadores.
* Traduzindo em números, se eu estiver mais ou menos certo isso significa um prejuízo bruto em torno de R$ 12 milhões. Portanto, bem mais que o faturado com os supostos 2 milhões de DVD´s já vendidos.
* Quem perde? Não só Padilha, Prado, Zazen & Cia. Perdem todos os que participaram do filme, perdem os distribuidores, os exibidores, o pipoqueiro, a bilheteira, etc... Viram a gravidade do assunto?
* E o argumento da democratização cultural? Acesso de todos, porque a maioria não pode pagar? Ora ora, balela... Ou o filme não vai ser lançado em DVD daqui a 6 meses? E não se pode ratear o aluguel de um DVD (preço de uma cópia pirata) entre vários? E a Globo, não vai passar o filme um dia? Filme com o Olavo de Paraíso Tropical? Ah vai... portanto, quem quisesse veria "Tropa" de graça... Mas do jeito que foi, o cinema brasileiro (e as milhares de pessoas que vivem dele, como este que vos escreve) perderam... e não foi pouco.

terça-feira, 25 de setembro de 2007

Endossando o que eu dizia no meu post abaixo, leiam a carta que Wagner Moura mandou ao Globo: http://oglobo.globo.com/cultura/mat/2007/09/24/297856410.asp

segunda-feira, 24 de setembro de 2007

Festival do Rio

Acabaram-se as filmagens de 174... ainda me resta muito trabalho pela frente, entrevistas, edição, acompanhar a pós, etc... mas depois de três (eternas) semanas de noturnas decidi que era hora de voltar ao cinema... à sala de cinema. Coincidentemente, no dia em que terminei, às 10 da manhã, uma diária de 13 horas, o Festival do Rio dava seu pontapé.
Desde então continuo no insuportável fuso da noite (dormindo às 8-9 e acordando 4 da tarde) e hoje nem consegui dormir, acho que bateu um cansaço maluco que faz com que as funções vitais fiquem mais malucas ainda... meu corpo doía de cansaço mas a cabeça não parava, e quando parava havia ali um inoportuno mosquito a zumbir no meu ouvida... enfim. Vamos ao festival.
Abertura, uma confusão daquelas, nunca vi uma abertura tão concorrida, quase fui esmagado na entrada. Mas deu tudo certo e então, para um Odeon abarrotado, apresentou-se o filme mais falada do ano: Tropa de Elite. Muito do que senti ao ver foi moldado por uma visão anterior do filme; não, eu não aderi à onda de pirataria, de onde nem meus amigos mais abastados escapam. Coincidentemente, durante o Bafici em Buenos Aires, meu amigo Eduardo, que pilota os fundos da Weinstein para filmes latinos (cuja primeira cria é "Tropa") recebeu o primeiríssimo corte do filme. Por ser eu tupiniquim e falar português (e ele não), chamou-me para que eu opinasse. Situação sempre difícil, pois um primeiro corte é aquela coisa. Ainda assim lembro-me de sair da sala de projeção do Malba profundamente impactado, faltava-me o ar. Sabia que havia ali algo poderoso. Muita coisa mudou, a começar pelo narrador, que deixou de ser a personagem de André Ramiro e passou a ser o de Wagner Moura. E isso não é pouca coisa... ao mesmo tempo em que tornou a trama mais clara, pode ter levantado a bandeira que um punhado de pessoas vêm chamando de fascista. Eu discordo, acho importante não confundir a voz da personagem (que ao narrar, tornou-se principal) com a do filme. Sobre isso leiam a excelente crítica de Eduardo Valente no http://www.revistacinética.com.br/. Isto posto, algumas observações:
- Poucas vezes vi um filme que mexesse tanto com a platéia. As reações à saída do Odeon, e depois, na festa, eram as mais diversas possíveis. Mas eram sempre reações fortes. Uma conhecida produtora revoltou-se, teve gente que saiu do film no meio, outros chamavam Tropa de o melhor filme do ano... algo que estranhei foi o comentário de que o filme glorificava demais aquelas personagens, ou que seria uma ode à tortura. Não sei se teve a ver com as duas versões, já que na anterior, quando não era Nascimento (Wagner Moura) que narrava eu o achei absolutamente detestável. Mas o fato é que eu continuei a achar aqueles homens sem coração, sem muito discernimento e extrapoladores do respeito cívico (as torturas são barra pesada). Mas vi isso justamente sob a ótica inversa: aquela representação fazia com que uma pessoa de bom senso (to me achando isso, aqui) desaprovasse do comportamento daqueles homens, não o sentisse glorificado. Mas parece que estou em minoria.
- Tecnicamente o filme é impecável. O som é dos melhores que já vi no cinema nacional, a trilha, perfeita, e Lula Carvalho firma-se aqui como um talento que nada deve so de seu pai. O elenco em sua quase totalidade, impressiona, e Wagner Moura consagra-se, junto com a novela, como o ator que certamente marcará uma época no audiovisual brasileiro.
- Finalmente, a pirataria... bem, isso renderia um outro post e muito já foi dito. Embora Globo Filmes nenhuma tivesse gerado esta mídia toda, desconfio que no fim das contas os piratas roubaram sim uma parcela do público total. Mas isso só saberemos depois que o filme entrar em cartaz. Agora, é impressionante a quantidade de pessoas que já viram. Saímos depois em grupo, pela noite carioca, e entre nós estava Caio Junqueira, que também brilha em papel de destaque. As pessoas a torto e a direito o saudavem pelo seu nome de Bope: 06. Caio me disse que nunca em sua carreira de mais de 15 anos, onde fez muita televisão (Globo) foi tão reconhecido pelo público. Surpreendente.
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Na sexta fui à estréia de Nome Próprio, de Murilo Salles. Fiquei fã de Murilo quando ele abraçou Árido Movie, filme que produziu com poucos recursos e que fotografou com muita beleza e inteligência. Seu mais novo longa tem momentos muito impactantes, uma interpretação impecável e ousada de Leandra Leal, bons atores (revelados no filme), e uma fotografia digital rica e original. Mas o filme não sustenta suas 2 horas e 10 de duração. O roteiro, que parece tentar demais ser anticonvencional, não dá estofo a tanto tempo. Nem os textos de Averbuck (projetados ad nauseum) e nem mesmo a bela fotografia. Estou certo de que se Salles tirasse 40 minutos de seu filme, teria algo mais poderoso em mãos e com potencial de atingir seu público alvo. Do jeito que está, vai ser mais um filme brasileiro a ficar duas semanas em cartaz.
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No sábado sessão dupla: Nas Asas da Panair, documentário de Marco Altberg, é tocante e belo ao resgatar a história da cia. aérea que provocou paixão sem precedentes, e que foi injustamente aniquilada pela ditadura, numa violência contra as 5000 famílias que lá trabalhavam. Talvez tenha gostado tanto por razões pessoais: meu tio-avô, Paulo Sampaio, a quem minha mãe adorava (era gêmeo idêntico do avô que nunca conheci) foi presidente da empresa por muito tempo, fez dela sua vida e quase morreu junto quando os milicos barbarizaram. O filme é dedicado a ele. Vale conferir nem que seja a canção que Milton Nascimento fez para a Panair, e que Elis gravou.
Corri para o palácio para ver (para mim) o filme mais aguardado de todos: a estréia em longas de ficção do meu amigo querido Chico Teixeira: A Casa de Alice. Nervoso por ele, pela estréia, por tudo, entreguei-me completamente à impressionante obra de Chico, impressionante pela complexidade que se esconde sob a aparente simplicidade. Acho que é dos filmes mais sutís que vi em toda a minha vida. O não dito fala tudo, e o que se diz nunca sobra. Marcos Pedroso na arte e Mauro Pinheiro na foto estão em sintonia absoluta com um elenco totalmente desconhecida mas poucas vezes tão afiados. São atores ali, mas parecem existir MESMO. O filme acaba e você quer mais, e fica em seguida imaginando onde estará aquela gente agora. O que será daqueles meninos, daquela velha adorável e da nossa heroína da vida cotidiana. Palmas e mais palmas para Chico e toda a sua equipe, e para o elenco sensacional encabeçado por uma Carla Ribas em estado de graça....
E chega, preciso dormir!

segunda-feira, 3 de setembro de 2007

174

Seguem a todo vapor as filmagens de 174, longa-metragem com direção de Bruno Barreto, onde sou responsável pelo making of (junto com a parceira Maria Resende). O longa é inspirado na história (real) de Sandro do Nascimento, que ficou famoso ao "sequestrar" o ônibus da linha 174 no RJ. Está sendo de imensa valia a experiência. É sempre um privilégio poder acompanhar de perto a realização de um filme em que se acredita, e neste caso acho que há potencial para um grande filme. O making of permite também o exercício do fazer cinema, e estou atento para filmar e entregar um filmete que seja mais que uma peça de venda, e sim o desvendar parcial da complexa maquinária do fazer cinema. E Bruno tem sido muito generoso, dividindo sem barreiras a sua própria experiência. Acredito neste filme porque a história de Sandro é emblemática e sintetiza inúmeras questões profundas deste louco país. Qualquer um que tenha visto o estupendo documentário de José Padilha sabe do que estou falando (quem não viu, corra, pois é uma das grandes obras de cinema da retomada). O roteiro de Bráulio Mantovani é bom pra c..., Bruno parece ter encontrado uma linguagem que casa bem com esta história e o ator que faz o papel-titulo arrebenta (o elenco como um todo também).
O meu interesse maior é na possibilidade de aceder a lugares e mundos que, de outra forma, me seriam quase que inacessíveis. A magia de se fazer cinema. Explorar os becos do Rio, nas mais diversas horas, é estar em contato com realidades que só confirmam para mim o quanto estamos alheios. É importante, fundamental eu diria, estar em sintonia com as mais diversas experiências e realidades, sobretudo num país com abismos como o nosso. Acabo de ver Cidade dos Homens. Confesso que me saturou um pouco esta realidade em particular (ou uma amostra de): o morro, o tráfico, etc... Em nada me lembrou o impacto, e o abrir dos olhos que Cidade de Deus me causou, há cinco anos... Bem, cinco anos se passaram e estes temas foram explorados ad nauseum. E meu interesse por eles também. Nos jornais, na literatura, na vida mesmo. E agora estou como que esgotado (não sei se o fato de estar filmando a vida de Sandro diariamente contribua, certamente). O que acontece é que sinto-me responsável, de certa forma, e impelido a fazer algo. Há cinco anos. Ao mesmo tempo sou um cidadão de bem, pago meus impostos, leva uma vida digna e correta, sou responsável pelos males sem fim? Que função posso ter? Ser artista não basta? Às vezes penso que sim, às vezes penso que não, às vezes me canso. Não parece haver solução. Ainda assim estou preparando um roteiro com a minha visão da coisa. Promete.
À margem de ter gostado do filme ou não (acho que esta estética deixou de ser novidade) é notável o impacto que Cidade de Deus e seus realizadores tiveram sobre todo um grupo de pessoas. Trabalhando no 174 isso fica claro pra mim. Criou-se um grupo, sobretudo de atores, que antes não tinham vez. Agora, eles tem esperanças. Tem um horizonte. Mudaram de vida. E à margem de sua representação nas telas ou de qualquer outro mérito, isto já é positivo e já é muito. Fernando Meirelles e sua turma fizeram alguma coisa. Fizeram uma diferença. E servem de exemplo. Como diria Raúl Gil, tiro meu chapéu.