Perdoem a (falta de) acentuacao, escrevo num teclado hispanico, desde Buenos Aires. Entre as muitas alegrias desta viagem destaco a breve, porém proveitosa participacao afetiva no BAFICI, festival de cinema independente da cidade. Foi uma rara oportunidade de "congregacao" para mim, com colegas cineastas da américa latina. Fiquei tocado ao trocar ideias com essa galera da mesma geracao que eu, mas de paises tao diferentes como o México e Uruguai (e alguns brasileiros) e ver o quanto nos une afinal. A pátria latino-americana. Tao rica, em tudo, com tanta coisa em comum mas parece que somos pouco articulados uns com os outros. No caso do cinema especificamente porque é tao dificil e incomum que nos seja dada a oportunidade de ver os filmes dos "hermanos" latinos? A barreira do idioma (que no meu caso inexiste, pois tenho ancestrais diretos em todos os paises do mercosul) nao serve como resposta. Mas aos poucos as coisas parecem estar mudando e cada vez mais os nossos mecanismos de cinema estao dando-se conta da importancia da acao conjunta, continental mesmo. Alem do intercambio de ideias sobre o nosso cinema com suas tematicas e linguagens, fui testemunha aqui de esforcos genuinos de produtores de diferentes paises visando co-producoes, e estes jovens, ambiciosos e talentosos profissionais nos renderao agradaveis surpresas em breve.
Infelizmente nao pude ver muitos filmes, acabei vendo só dois e ambos brasileiros. Considero-me privilegiado por ter sido uma das poucas pessoas que viu tanto SANTIAGO, de Joao Moreira Salles, só exibido antes no E Tudo Verdade, e DESERTO FELIZ, de Paulo Caldas, exibido em Berlim e Guadalajara. Ambos sao um sopro de vento no ambiente por vezes sufocado da nossa cinematografia.
Santiago é uma pequena jóia. As suas muitas camadas sao atraentes a qualquer publico e Joao Moreira Salles reafirma seu posto como um dos grandes documentaristas do mundo, hoje, e tambem a potencialidade infinita do documentario brasileiro. Fiquei comovido e surpreso com a franqueza com que ele expoe a si mesmo num documentario sobre o mordomo de sua familia, personagem este rico baixo qualquer ótica. Belíssimo. Mesmo. Uma pena que por erro (sabe-se lá de quem) a copia que passou aqui tinha a narracao em ingles (de Nando Alves Pinto, ótimo como de costume) e nao a do irmao do diretor, em portugues. Mas deu uma ótima desculpa para se rever o filme.
Paulo Caldas fez um filme interessante que vai na contramao, ao mesmo tempo em que trafega junto com seus contemporaneos (a turma de Lirio Ferreira, Marcelo Gomes, Claudio Assis, Karim Ainouz). Parece contraditorio o que digo, e é. Um filme que divide com outros desta safra, temática, e/ou elenco e, porque nao, universo. Mas é muito diferente de Cinemas e Aspirinas, Suely, Baixio. É um filme com muitas qualidades e defeitos. Mas que sabe se aproveitar da maioria de seus defeitos. Um filme autoral (posso afirmar isso mesmo sem ter visto os outros filmes de Caldas) e radical em suas escolhas, mas genuinamente radical. As vezes peca por isso. Que tenha vida longa em nossos cinemas. Assim como Santiago.
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